quarta-feira, 20 de agosto de 2008

A LINGUÍSTICA E SUAS VARIEDADES

PORTFÓLIO: Alunas do 3º período do curso de Letras - Circuito 7

Catiune Pires e Simone Nunes

INTRODUÇÃO

Atualmente a lingüística tem sido referência de muitas discussões, como exemplo pode-se enfatizar a língua portuguesa, onde a mesma possui uma padronização e uma variação, a primeira no sentido das prescrições normativas da gramática, e a segunda no sentido das experiências analisadas no contexto da linguagem falada por cada região, e como afirma os PCNs, para a escola cumprir a função de ensinar a escrita e a língua padrão, ela não deve desmerecer as variedades lingüísticas e nem permitir que a mesma “influencie” na aprendizagem do educando.
Segundo Carlos Drummond a língua vive transformações significativas e confusas, mas traz consigo o sentido real de acordo a época e a classe em que cada indivíduo vive, por essa razão, o ser humano como parte instituinte da sociedade deve estar consciente dessas varias lingüísticas prontos a respeitar e aceitar essas variedades. Dentre essas variedades, podemos destacar algumas expressões existentes na música AI D’ EU SODADE cantada por Xangai:

Ai D'eu Sodade
Marido se alevanta e vai armá um mundé

prá pegá u'a paca gordaprá nós cumê um sarapaté
Aruera é pau pesado, nué minha véa
cai e machuca meu pé e ai d'eu sodade
Intonce marido se alevanta e vai na casa da tua vó
buscá a ispingarda dela procê caçá um mocó
só que no lajedo tem cobra braba,
nué minha véa me morde e fica pió e ai d'eu sodade
Marido se alevanta e vai caçá u'a siriema
nois come a carne dela e faiz u'a bassora das pena
quem me dera tá agora, nué minha véa
nos braço d'uma roxa morena e ai d'eu sodade
Sujeito se alevanta e vai na casa do venderão
comprá u'a carne gorda prá nois cumê um pirão
é que eu num tenho mais dinhero, nué minha véa
fiado num compro não e ai d'eu sodade
Marido se alevanta e vai na venda do venderin
comprar déis metro de chita pra fazê ropa pros nossos fiin
aí dent'o tem um cochão véi, nué minha véa
dismancha e faiz u'as carça prá mim e ai d'eu sodade
Disgramado te alevanta dexa di cê priguiçosoo
home qui num trabaia num pode cumê gostoso
é que trabaiá é muito bom, nué minha véa
mais é um poco arriscosoe ai d'eu sodade
Marido te alevanta e vem tomá um mingau
qui é prá criá sustança prá nois fazê um calamengau
brincadeira de manhã cedo, nué minha véa
arrisca quebrá o pau e ai d'eu sodade
Marido seu disgraçado tu ai de morrê
cachorro ai de ti latíe urubú ai de ti cumê
se eu soubesse disso tudo, nué minha véa
eu num casava cum ocêe ai d'eu sodade.

Para compreendermos melhor basta observarmos estas expressões e percebermos que a linguagem típica caipira usava na música, transmite-nos o mesmo sentido significativo que uma linguagem em sua forma padrão transmitiria. Para melhor entendimento desta afirmação basta olharmos a situação em questão pelo ângulo da diversidade lingüística.

A LINGUÍSTICA E SUAS VARIEDADES

Diante de todos os fatores abordados, somos levados a crer que a Língua Portuguesa é uma unidade composta de muitas variedades. O aluno ao entrar na escola, por exemplo, já sabe pelo menos uma dessas variedades - aquela que aprendeu simplesmente pelo fato de estar inserido em uma comunidade de falante. Certamente já é consciente que determinadas expressões ou modo de dizer pode ou não ser apropriados para esta ou aquela situação.
Frente aos fenômenos da variação, não basta somente uma mudança de atitude, a escola precisa cuidar para que não se reproduza em seu espaço à descriminação lingüística, pelo contrario ela pode e deve permitir e proporcionar a valorização dessa variedade. Além disso, os padrões próprios da tradição escrita, não são os mesmos que os padrões de uso oral, ainda que haja situações de fala orientada pela escrita.
As pesquisas fundamentadas na sociolingüística educacional mostram que é possível desenvolver práticas de linguagem significativas, no sentido de incluir alunos oriundos das classes sociais menos favorecidas, fazendo com esses alunos deixem de se sentir estrangeiros em relação à língua utilizada pela escola, e com isso consigam participar de forma satisfatória das práticas sociais que demandam conhecimentos lingüísticos diversos. Diferentemente dos alunos oriundos das classes mais abastadas, cuja variedade de língua é também a variante de prestígio, e também a que é ensinada na escola, a maioria dos alunos das classes menos favorecidas além de ter que, praticamente, aprender uma nova língua, não tem sua variedade de língua valorizada e muito menos colocada como objeto de estudo na sala de aula. O que se observa é que, muitas vezes, os alunos usuários das variedades populares são discriminados em função da sua maneira de falar.
Por outro lado, as dificuldades que esses alunos apresentam em relação às atividades lingüísticas são tratadas como se estas ocorressem em função da falta de capacidade dos alunos, quando na verdade tais dificuldades estão relacionadas ao desconhecimento da escola em relação às variedades lingüísticas existentes no Brasil, que tenta trabalhar a língua materna como se esta fosse algo estático, puro, homogêneo, uniforme ou até mesmo intocável como defendem muitos gramáticos.
Por essa razão é que a escola como parte fundamental na formação humana, deve buscar incorporar em sua proposta pedagógica, conteúdos e situações voltadas para a realidade do aluno, onde ele possa valorizar seus princípios e sua forma de falar, sendo que a partir daí ele possa observar e reconhecer que sua realidade cultural diferencia-se e tem o seu valor igualmente o de outras realidades culturais.
Contudo, a Língua Portuguesa como todas as outras línguas humanas são para ser compreendida como um organismo, passível de variação e mudança, que sofre influencia de vários fatores lingüísticos e não lingüísticos. Isto significa que a nossa língua não esta pronta, que não é neutra ou mesmo algo inerente que se possa colocar numa forma, mas algo que se encontra em permanente processo de variação, em que expressa à diversidade dos grupos sociais que a fala, um exemplo claro que confirma essas mudanças, esta estrofe a segui retirada do poema Aula de Português de Drummond:



[...] Já esqueci a língua em que comia,
em que pedia para ir La fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortado,
do namoro com a prima.
O português são dois; o outro, mistério.



Podemos observar que nesta estrofe o autor deixa claro a constante mudança da língua, ou seja, para cada época, cada região, cada classe social e cada indivíduo, a uma forma de falar e é justamente isso que dá a identidade de cada um.
Segundo Labov (1983) (2), a variação existe em todas as línguas naturais humanas, é inerente ao sistema lingüístico, ocorre na fala de uma comunidade e, inclusive, na fala de uma mesma pessoa. Isto significa que a variação sempre existiu e sempre existirá independente de qualquer ação normativa. Assim, quando falamos em Língua Portuguesa estamos falando de uma unidade que se constitui de muitas variedades. E mesmo havendo no Brasil uma aparente unidade lingüística e apenas uma língua nacional, é possível observar variação em diversos níveis da estrutura lingüística como ilustram os exemplos a seguir, retirados da música, AI D’ EU SODADE, cantada por Xangai: ai d’ eu sodade ( adeus saudade), alevanta (levanta), entonce (então), cume (comer), cum ocê ( com você) e na história em quadrinho abaixo.


Estes são exemplos de variações lingüísticas que não somente identifica os falantes de comunidades lingüísticas em diferentes regiões como ainda se multiplicam em uma mesma comunidade de fala. Isso significa dizer que não existem variedades fixas: em um mesmo espaço social convivem diferentes variedades lingüísticas (padrão e não padrão), geralmente associadas a diferentes valores sociais (PCN, 1998).
Por outro lado, não devemos esquecer que algumas variedades lingüísticas são fortemente descriminadas, isto é, tratada de modo preconceituoso e anticientífico. Não porque essas variedades sejam inferiores ou porque sejam menos elaboradas do ponto de vista lingüístico, mas simplesmente porque difere em alguns aspectos (quase sempre relacionados à forma), daqueles que os gramáticos tradicionais elegeram como sendo o “correto”. Para trabalhar a variação lingüística, o professor deve introduzir, ao mesmo tempo, por um lado, o respeito e a aceitação aos vários falares dos alunos (MOLLICA 1998); e por outro, uma prática de ensino e aprendizagem cujo objeto de estudo seja os próprios textos dos alunos (orais e escritos). O que também não significa o abandono ao ensino da língua culta/padrão, pois esta continua sendo a variante de prestígio, portanto é importante que também seja trabalhada em sala de aula. Além disso, é imprescindível que haja constantemente uma prática de reflexão sobre os usos das diversas variedades lingüísticas existentes no País, nos diversos gêneros textuais, tanto na modalidade oral quanto na escrita, para que o aluno saiba que cada uma dessas variedades (padrão e não-padrão) tem seus contextos de uso.
Para Santos e Cavalcante (2000), para trabalhar a variação lingüística em sala de aula seria interessante que fossem realizadas atividades enfatizando a diferença entre textos produzidos oralmente e textos escritos, trabalhando o máximo possível os próprios textos dos alunos (orais e escritos). E chamando a atenção para a possibilidade de sempre poder realizar a retextualização, podendo melhorar vários aspectos do texto, inclusive mudando de gênero.
Agindo assim, não somente estamos conscientizando os nossos alunos, enriquecendo os seus dialetos, mas também aumentando o leque de suas possibilidades lingüísticas, que associadas aos seus contextos de uso podem tornar esses alunos usuários muito mais conscientes e competentes quanto aos diversos usos da língua.

CONCLUSÃO

Assim como afirma Marcos Bagno em seu livro Preconceito Lingüístico, não podemos ter a ilusão de querer acabar com essa discriminação lingüística de uma hora para outra, porque isso só será possível quando houver uma transformação radical do tipo de sociedade em que estamos inseridos, que é uma sociedade que para existir precisa da discriminação de tudo que é diferente, da exclusão da maioria, em beneficio de uma pequena minoria.

Portanto a discriminação de algumas variedades lingüísticas tratadas de forma preconceituosa e anticientífica expressam os próprios valores existentes no interior de uma sociedade. Por isso mesmo, preconceito lingüístico como qualquer outro preconceito, resulta de avaliações subjetivas dos grupos sociais e deve ser combatida com vigor e energia. É importante que o indivíduo ao aprender novas formas lingüísticas, particularmente a escrita e o padrão de oralidade mais formal orientado pela tradição gramatical, entenda que todas as variedades lingüísticas são legítimas e próprias da história e da cultura humana.

REFERÊNCIAS:

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS, Língua Portuguesa de 5ª a 8ª série, Brasília: MEC/SEF, 1998.

MARCOS, Bagno. Preconceito Lingüístico. São Paulo: Edição Loyola, 1999. http://www.cedu.ufal.br/

LABOV, William. Modelos Sociolingüísticos. Madrid: ediciones Cátedral. 1983. Tradución de José Miguel Herreras.

MOLLICA, M. Cecília (org.). Introdução à Sociolingüística Variacionista. Cadernos didáticos. Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ. 1992.

SANTOS, M. B. Cavacante, M. A da Silva. Contribuição da Teoria da Variação.

DICAS DE FILMES:














DICAS DE LIVROS:

5 comentários:

... disse...

É bom ver os trabalhos de vocês publicados aqui no blog da UP de Lapão. Parabéns pela iniciativa. Um forte abraço a todos. Profª Eliéte (Lingüística Sócio-Histórica do Português).

Audir disse...

Oi! meu nome é Audir, fiz a FTC na Up de Wagner e fizemos trabalhos sobre esse mesmo tema.
Parabéns! Ficou ótimo! Abraços!!!
Audir - Ibiquera-Bahia

Unknown disse...

Sou Eliana Maia,Aluna do 3º período do curso de letras da UP Iguatemi Salvador. Estamos trabalhando com o mesmo tema, sob a orientação da Profª Eliete.
Parabéns pelo trabalho.

Abraços,
Eliana Maia liamaia89@yahoo.com.br

Elienai disse...

Lindo trabalho, meninas!!
Também sou aluna de Letras, EaD UFMS, polo de Rio Brilhante. Passei por aqui para pesquisar sobre o mesmo tema. Me ajudou muito!
Sucesso!!
Elienai.

Anônimo disse...

que jossa!!!!!QUE BOSTA